Home Terezinha Oliveira Uma certa casa: é o início, meio e o recomeço

Uma certa casa: é o início, meio e o recomeço

Em um lugar chamado “Coração”, devido à sua centralidade geodésica, existe uma casa com a missão de ser um Centro de Referência Sociológico, Histórico e Cultural, abrangendo a vida e a memória de Antônio Conselheiro. Não tenho a data de construção da Casa, mas é sabido que em 13 de março de 1830, nasceu o menino batizado com o nome de Antônio Vicente Mendes Maciel. O pai queria vê-lo padre e o destino o levou à peregrinação, espalhando o evangelho e esperanças de uma terra prometida. O Sertão foi o espaço onde ele e os seguidores buscaram a nova Canaã e se estabeleceram às margens do Rio Vaza Barris, no Belo Monte baiano, onde estava abandonada a Fazenda Canudos.

No lugar onde ele nasceu também havia um rio, bem atrás de sua casa; e ao poente estava um serrote parecido com o de Belo Monte. Esse lugar, de onde ele saiu aos 27 anos, era a Vila Nova de Campo Maior e o rio era o Ibú. Hoje o rio e a cidade têm o nome de Quixeramobim. A casa resistiu, mas o rio agoniza pelo descaso com quem nos deu vida. O Ibú foi o caminho dos tangedores de gado, a fonte de alimentos e insumo para a pecuária e lavoura. A casa resistiu pela sorte de ter pertencido a uma família que não trazia a gana demolidora dos ignorantes vilões do Patrimônio Histórico e Arquitetônico Colonial. Um desses moradores foi o arquiteto e compositor Fausto Nilo e em uma de suas letras faz a ligação da casa e o rio

“Casa tudo azul eu me lembro de você
Mas hoje foi difícil lhe deixar
Todo amor que havia em meu retrato podes ver
E tudo que eu vivi nessa janela, vai passar 
Há um velho rio que haveremos de esquecer
Mesmo que essa casa não resista à solidão …”
Fausto Nilo, cantor, compositor e arquiteto

O imóvel nº 210 da rua Cônego Aureliano Mota é uma das pouquíssimas edificações de relevância histórica e arquitetônica da área Central, onde surgiu a vila – atual cidade de Quixeramobim. O ano de 1830 deu início a história que a casa impulsionou a partir de 1857 e foi culminar no massacre de 1897. A derradeira agonia de um sonho igualitário. O personagem central, os demais envolvidos e os fatos reais eram de pouco interesse para os conterrâneos de Antônio. Nas escolas não eram comentados, em conversas os fatos eram distorcidos sempre desfavorecendo os feitos do peregrino, e assim foi permanecendo apenas a casa e muitos boatos. Por aqui até estranhavam se algum forasteiro indagava sobre Conselheiro, pois em plagas distantes, estudiosos conheciam e pesquisavam. O cinema e a televisão repercutiram a saga deste quixeramobinense, ampliando o raio de interesse em conhecê-lo. Mas o fator fundamental para que o Líder de Canudos fosse “descoberto” por seus conterrâneos surgiu com o grupo do Movimento Antônio Conselheiro – MAC, incansáveis propagadores das ideias e feitos referentes ao Arraial de Canudos, estabelecendo o intercâmbio Quixeramobim – Canudos, cada vez mais legitimado.

Se o contexto inicial fora desalentador, as últimas décadas trouxeram pequenos avanços com novas adesões. O envolvimento da Comunidade Escolar e o reconhecimento da casa como um Patrimônio Histórico e Arquitetônico do Estado do Ceará, marcaram um novo olhar sobre esse bem e a trajetória do seu mais ilustre morador.

Agora é o recomeço; o honroso destino dessa casa promete outra revolução – o fortalecimento da história e da cultura local; um espaço para discussão democrática de políticas públicas, o acesso pelos movimentos populares e um leque de outras ações poderão surgir. É o resgate de uma grande dívida com os mártires de Canudos. É um tempo de esperanças e júbilo começando.

Obs: apenas uma coisa me entristece – o rio agonizante não ter renascido com a bela casa

Para conferir mais artigos na coluna de Terezinha Oliveira, clique AQUI.

Foto: Divulgação/Secult

2 comentários

  1. Parabéns, querida Terezinha. Um belíssimo texto. Muito importante esse resgate da história. E que pena o rio estar agonizante! Mais uma luta a ser travada. Saudade daí. Saudade desse coração do Ceará que está no meu coração. Um grande abraço.

  2. Parabéns, Terezinha pela coluna e pelo texto. Sou canudense, moro em São Paulo, sou neto de descendente da Guerra de Canudos, sou fã do grande Líder Antônio Conselheiro, temos aqui em S.Paulo uma pequena ONG, UPIC-União Pelos Ideais de Canudos, onde fazemos Festa de Encontros de canudenses e Amigos. Fiquei feliz pela casa(recentemente restaurada)nascimento de Antônio Conselheiro está tendo um renascimento cultural de sua história.

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