Acho que foi o Mário Quintana quem falou que dia de chuva é bom para ler poemas, mas não se deve escrever nenhum. Então, fui ler o Jáder de Carvalho e me deparei com essa lindeza de verso: “as saudades vieram todas não faltou nenhuma”.
A chuva tem esse poder.
O poeta de Terra Bárbara também costumava bradar: sou doido por tempo de chuva! E no sertão quem não é doido por tempo de chuva?
Nas ruas de Quixeramobim, por exemplo, as pessoas mudam. Entusiasmam-se e logo engatam aquelas conversas empolgantes de: “ – Com mais uma chuvinha o açude do Belém sangra…”, “ – O Pirabibu aquele açudão já encheu!”, “– O Fogareiro já pegou um bocado de água”.
Tudo se torna expectativa e desejo de bom inverno. E bom inverno é sinônimo de fartura.
Uma chuvinha miúda, pouco mais que neblina, já trás a babugem para o gado esquálido que já nem forças tinha para mugir forte.
É como sentenciou Guimarães Rosa: ”perto de muita água tudo é feliz!“.
Enfim, sempre que chove muito sou menino outra vez.
Recordo que quando pequeno, em ano de muitas águas caídas do céu, assim que a barragem de Quixeramobim enchia, me batia uma vontade danada de pular lá de cima, mas nunca tive coragem. Sempre fui um medroso de carteirinha, os outros meninos pulavam, eu ficava olhando meio abobalhado das varandas, e a impressão que tinha era que muitos deles, de braços abertos antes do inevitável mergulho, uns tantos metros até o pouso, por vezes, quase paravam e também paravam o tempo, eram meninos beija-flores triunfando sobre as águas, desafiando a própria gravidade.
Ah, sou doido por tempo de chuva.
Bruno Paulino
Professor e escritor
Foto: Tarcísio Filho