Com direção do professor Davi Sales e produção do Coletivo Zolhos (grupo de arte), o documentário Cartografias Afetivas da Cidade será exibido nesse dia 5 de junho, às 19h, na sala de cinema Falb Rangel, na Casa da Cultura de Sobral. E, de acordo com a proposta, tornada possível com apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará e a Lei Paulo Gustavo, de incentivo às artes, o filme é um convite à sensibilidade.
A ideia é propor um olhar atento ao desenvolvimento de Sobral por meio das histórias de vida e vivência de pessoas em situação de rua. Invisibilizadas pela sociedade, essas trajetórias humanas se entrelaçam com o crescimento urbano, reafirmando seu papel como parte integrante e essencial da história da maior cidade da região norte do Ceará.
O material audiovisual é apresentado pelos próprios participantes, em depoimentos diretos, onde contam suas histórias de vida, desde a infância, as relações com os parentes e o início da vida nas ruas, desencadeado por conflitos familiares. Ao longo dos relatos, homens e mulheres reconstroem sua trajetória de vida, ao narrar as dificuldades do cotidiano, sem o apoio familiar, por anos, em busca da sobrevivência no município, que hoje conta com cerca de 210 mil habitantes.
As relações com outras pessoas na mesma situação de vulnerabilidade, a exclusão, o medo, a angústia e a solidão, além do abuso de álcool e outras drogas, se tornam o ponto de partida para um momento de reavaliação das muitas trajetórias marcadas pela rua. O documentário revela momentos de violência, dificuldades e de outras experiências de vida compartilhadas com o expectador.
Entre os depoimentos, está o da mulher trans, Jamile de Lima, abandonada pela família, quando adolescente que, agora, adulta, ainda luta contra o vício. “Eu vim para as ruas, porque na minha infância eu sofria muito preconceito, por parte do meu pai e do meu professor, além da escola. E foi tudo muito rápido. Quando percebi, já estava na rua sozinha. Já fui presa, sofri nas mãos de um antigo companheiro, que me espancava; e hoje, eu tento me manter firme e fora do contato com as drogas”, desabafa.
Em outro depoimento, Maria do Nascimento relata que saiu de casa jovem e perdeu o contato com a família, ao conhecer um morador de rua. “Eu era muito nova, não usava drogas, quando decidi seguir esse homem. Fugi de casa e minha vida mudou completamente. Logo, caí nas drogas. Sofri agressões desse companheiro e me vi forçada a me defender com a Lei Maria da Penha. Ele foi preso e eu segui com minha vida, até hoje, nas ruas de Sobral”, relata a moradora.
De acordo com o Programa Cidades Sustentáveis, uma agenda de sustentabilidade urbana que incorpora as dimensões social, ambiental, econômica, política e cultural no planejamento municipal no país, Sobral conta com cerca de cem pessoas em situação de rua. Elas são definidas como pessoas que não têm moradia e que pernoitam nas ruas, praças, calçadas, marquises, jardins, baixos de viadutos, terrenos baldios e áreas externas de imóveis.
Em busca de minimizar o impacto social na vida dessas pessoas, Sobral conta com o Centro POP (Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop), ligado à Secretaria dos Direitos Humanos, Habitação e Assistência Social (Sedhas). O espaço fornece atendimento à população em situação de rua, oferecendo escuta qualificada e serviços essenciais (banho, alimentação, dentre outros), além de encaminhamentos a outras políticas públicas.
Ao ser atendido, o usuário passa por um processo de escuta qualificada para que sejam averiguadas suas principais necessidades. Se desejar, poderá ser encaminhado para casas de recuperação, para a Unidade de Acolhimento de Dependentes Químicos ou para os acolhimentos institucionais.
Para Francisco Carlos Justino, coordenador do Centro POP, “os conflitos familiares, seguidos da perda de emprego, acabam por desencadear a realidade das ruas. Também há o uso abusivo de drogas, que afasta essas pessoas do convívio familiar. É uma população, predominantemente, masculina, mas que conta com a presença de mulheres, que também ocupam as ruas da cidade e contam com esse apoio do Centro POP, por meio de serviços de atendimento básico e diversas atividades”, reforça.
Para o produtor Wescley Braga, à frente do Coletivo Cultural Zolhos, “a ideia do Coletivo, que reúne artista de diversas linguagens e se faz presente por meio de editais, é construir sua trajetória como um farol de resistência cultural, onde a arte se faz instrumento de transformação social. Sua atuação se materializa, especialmente, por meio de três pilares interligados: produções audiovisuais comprometidas com a memória, publicações que eternizam saberes populares e oficinas gratuitas que semeiam autonomia”, reflete.
Segundo o diretor do documentário, professor e arte-educador, Davi Sales, a vontade de gravar esses depoimentos surgiu da necessidade de chamar a atenção da sociedade para a dura realidade de quem vive nas ruas. “Eu trabalhei, por quase dez anos, no serviço social aqui do município e tive muito contato com a população carente e a população de rua. Eu percebi, ao longo do tempo, que a cidade se desenvolvia e essa população da rua aumentava, cada vez mais, mas seguia invisibilizada. Ao ter contato com uma dessas pessoas, numa conversa franca, eu senti a real necessidade de ver essas muitas histórias registradas”, explica.
Serviço
Estreia do documentário Cartografias Afetivas da Cidade
Local: Sala de cinema Falb Rangel, na Casa da Cultura de Sobral
Dia: 5 de junho
Horário: 19 h