O recente episódio envolvendo o presidente da Câmara Municipal de Madalena, vereador João Filho (PT), traz à tona uma questão que ultrapassa os muros da política local e atinge o cerne da democracia: o respeito à liberdade de imprensa.
Segundo amplamente noticiado, o parlamentar, insatisfeito com uma matéria jornalística divulgada pelo grupo de comunicação RTi, responsável pela programação da emissora Sertão FM, entrou sem autorização nas dependências privadas da empresa, cobrando direito de resposta e gravando um vídeo em tom provocativo. A cena, além de inusitada, é simbólica. Representa o retrato preocupante de uma parte da classe política que ainda confunde o espaço público com o pessoal e a crítica jornalística com perseguição.
A imprensa livre é um dos pilares mais sólidos da vida democrática. É ela quem permite que a sociedade acompanhe e fiscalize o uso dos recursos públicos, que cobre coerência e ética de seus representantes e que traga à luz o que, muitas vezes, se tenta esconder sob o peso da conveniência política. Atacar a imprensa é, portanto, atacar o direito do cidadão de ser informado.
A matéria em questão, produzida pelo Repórter Ceará e reproduzida pela Sertão FM, apresentou dados oficiais do Portal da Transparência dos Municípios e do Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE). Nenhuma invenção, nenhum juízo pessoal, apenas fatos: a Câmara de Madalena, sob a presidência de João Filho, pagou em 2025 R$ 55.900,00 em diárias, mais que o dobro de anos anteriores. Desses valores, R$ 19.450,00 foram destinados ao próprio presidente.
Quando um representante do povo se vê diante de dados públicos que o incomodam, o caminho natural em uma sociedade madura é o do esclarecimento responsável, do debate público e da transparência. O que não se admite em nenhuma hipótese é a tentativa de intimidação ou o uso do cargo para constranger veículos e profissionais da imprensa.
A atitude do vereador, ao invadir um espaço privado e debochar do trabalho jornalístico, é um retrocesso civilizatório. Demonstra não apenas falta de preparo institucional, mas sobretudo falta de compreensão sobre o papel da comunicação livre em um Estado Democrático de Direito.
É preciso recordar que a imprensa não é inimiga do poder público. Ela é, na verdade, um instrumento essencial de equilíbrio entre poder e responsabilidade. O jornalista não deve satisfação a políticos, mas sim à sociedade. O compromisso da imprensa é com a verdade dos fatos, e não com a conveniência de quem é alvo de suas reportagens.
O Sistema Maior de Comunicação, ao manifestar solidariedade à equipe da RTi, reafirma um princípio inegociável: a liberdade de expressão e o direito de informar são valores que não podem ser dobrados pelo medo ou pela pressão. Nenhum microfone será silenciado. Nenhuma notícia deixará de ser publicada por desagradar quem ocupa cargos de poder.
O presidente da Câmara de Madalena tem todo o direito de se defender e os meios adequados para fazê-lo. Pode enviar nota, conceder entrevista, apresentar documentos, acionar judicialmente se julgar necessário. O que não pode é agir com desrespeito, ultrapassando os limites éticos e legais que regem a convivência entre as instituições.
A democracia não se constrói com gestos de bravata, mas com responsabilidade e diálogo. É justamente por isso que a imprensa precisa ser livre, corajosa e vigilante. É ela quem impede que o poder se acomode e que os interesses públicos sejam sufocados pelos privados.
O episódio de Madalena deve servir como um alerta e uma lição. A liberdade de imprensa é o primeiro e o último bastião da democracia. Quando um político tenta calar a voz que o critica, o que está em jogo não é apenas uma divergência local, mas o direito de toda uma sociedade de ser informada com independência e verdade.