Um fato ocorrido em determinado tempo poderá afetar outro vindouro no futuro? Na história e na vida vemos que sim. Se Hitler tivesse sido aceito na Academia de Belas Artes de Viena, seria hoje estudado como o crápula cruel e monstruoso que foi ou como um grande artista que poderia ter sido? Também na história aprendemos que as possibilidades são infinitas, e por isso ficamos com os fatos, e o fato foi que Hitler se tornou um ditador sanguinário e louco por toda conjuntura de sua vida. Digo isso para explicar os pontos de vista que serão apresentados nessa e na próxima coluna, partes do mesmo tema: a influencia que os sufrágios de 2020 terão nas próximas eleições gerais brasileiras – sim, pois essa primeira parte trata da eleição norte-americana, mas a próxima será sobre as municipais de novembro.
Os Estados Unidos passam por uma turbulência política acentuada pela pandemia da Covid-19, que já vitimou mais de 180 mil vidas estadunidenses, desequilibrou a até então sólida economia da mais poderosa nação do mundo e elevou os índices de impopularidade de seu mandatário, o republicano Donald Trump. Isso sem contar com o fator da insurreição popular que tomou conta das ruas e massas das principais cidades do país em decorrência da morte de George Floyd e da ferida nunca cicatrizada do racismo na sociedade yankee. Trump, que caminhava para uma possível já ensossa vitória, agora vê seu adversário, Joe Biden – ex-vice-presidente na gestão Obama – disparar nas pesquisas e despontar em primeiro lugar. Biden, após sua confirmação como candidato nas internas do partido Democrata, teve uma das mais acertadas decisões políticas dos últimos tempos: convidou para completar sua chapa a senadora Kamala Harris, mulher, defensora de minorias, filha de imigrantes e afinada ao movimento negro dos Estados Unidos. Com isso, atingiu em cheio Trump em todos os públicos que o atual presidente nunca teve o discurso aceito, o que aumenta mais ainda sua rejeição. Essa tende a crescer, também com a desastrosa convenção do partido Republicano, que usou do medo e constrangimento para dialogar com a sociedade. Mas afinal, o que uma derrota de Trump representaria para o Brasil e, em especial, para as próximas eleições?
A política internacional do chanceler Ernesto Araújo tomou uma arriscada decisão: se alinhar, sem qualquer que seja a crítica, as decisões de Washington, usando da história da diplomacia brasileira como sustentador dos discursos e decisões do presidente norte-americano mais contestado internacionalmente. E isso por questões de afinidade ideológica, e não estratégicas para o desenvolvimento de nosso país. O governo Bolsonaro trata os Estados Unidos como se ele fosse o principal parceiro comercial do Brasil – coisa que não é, já que a China detém esse papel – e para agrave de situação, Bolsonaro não gosta da política dos democratas e Biden e sua vice, Harris, já condenaram publicamente declarações de nosso presidente. O primeiro impacto dessa reviravolta nos Estados Unidos em nosso país seria imagético, já que o governo Federal “perderia” essa parceria, a família Bolsonaro ficaria sem seus ídolos e a extrema-direita brasileira iria ter de rebolar para achar uma narrativa palpável para o acontecimento. Até 2022, a oposição no Brasil poderá, então, usar e abusar da primeira grande derrota da onda dos discursos baseados em Fake News iniciados por Trump em 2016 e utilizados nas campanhas brasileiras de 2018, bem como todos os políticos baseados em falas polêmicas, teocráticas charlatãs e saídas fáceis para crises – que beiram as usadas por Mussolini e o já citado Hitler – seriam abalados. Na política e na história, a narrativa sempre será uma das protagonistas.
Em breve, a segunda parte deste tema. Esta coluna tem a pretensão de ser colaborativa. Se crê que algum tema da política e dos acasos sociais são de grande relevância, entre em contato, terei o prazer de discuti-los com você e, a depender da conversa, virar assunto de nosso espaço.