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A campanha que Capitão Wagner pediu a Deus

As principais lideranças políticas do bloco de partidos que governou o Ceará por 16 anos não chegaram a bom acordo sobre a continuidade do projeto e se dividiram em duas candidaturas: Elmano Freitas (PT) e Roberto Cláudio (PDT). A partir daí, diferenças e restrições críticas antes guardadas no armário das conveniências vieram à tona.

São tantas as críticas lançadas de parte a parte, como se viu no debate de formato dinâmico promovido pela TV Cidade, que ao homem comum que assistia àquilo deve ter saltado a perplexidade de uma pergunta que não quis calar: como essa gente conseguiu sorrir lado a lado por tanto tempo nas imagens de campanhas anteriores?

Mas num aspecto, pelo menos, tanto os que hoje seguem Camilo Santana quanto os que ficaram nas fileiras sob o comando de Ciro Gomes estão em pleno acordo: a decisão comum de oferecer ao candidato de oposição, Capitão Wagner, as melhores condições possíveis de disputa para que obtenha êxito no seu projeto de tirar todos eles do poder.

No debate mencionado, era visível a alegria do deputado, candidato apoiado por Bolsonaro no Ceará, diante do espetáculo oferecido pelos ex-aliados. Por pouco não os agradeceu, mas não conseguia disfarçar o sorriso no canto da boca, como quem diz: com adversários assim, quem precisa de aliados para vencer as eleições?

A estratégia divisionista é iniciativa de Roberto Cláudio, que partiu de um cálculo: o campo conservador, representado pelo capitão, já teria lugar assegurado no segundo turno. Restaria a ele, portanto, centrar fogo no candidato do PT e dele arrancar a oportunidade de representar o campo progressista na fase final da campanha.

Pelas projeções atuais, os estrategistas de RC sabem que, num provável segundo turno, ele acolheria por gravidade a grande maioria dos votos de Elmano. E sabem que a recíproca não é verdadeira: parcela expressiva de seus eleitores, adeptos do antipetismo moderado, iriam se abster no segundo turno, garantindo ao capitão suficiente vantagem.

Elmano, mal orientado no debate e outras ocasiões, tem aceitado abrir espaço para o contencioso com seu ex-aliado, quando poderia expor a patética contradição do agora adversário com a ironia de poucas palavras e tentar recompor a primazia do discurso que lhe interessa fazer, e não se deixar pautar pela estratégia dele.

Enquanto gastam tempo, energia e a paciência do eleitor com as mazelas de seu divórcio, os candidatos progressistas permitem, por outro lado, que Capitão Wagner consolide a cada dia mais a imagem, ideal para ele agora, de candidato “independente”, sem alinhamento automático com o projeto de reeleição de Bolsonaro.

Embora tenham feito menção ao fato no debate, aquele é um espaço de menor audiência e penetração. Na propaganda de televisão e rádio, bem como nas mídias digitais, o plano que já deveria ser uma linha estratégica central desde o primeiro dia de agosto – colar o capitão de cá no capitão de lá – adormece na gaveta dos bruxos.

Enquanto isso, Wagner se vale de uma orientação estratégica consistente para se manter colado ao pé direito alto dos 40% de intenções de votos, de onde (ele sabe) não tem para onde crescer, mas já atende seus objetivos mantê-las naquele patamar, acumulando gordura para queimar num segundo turno de curta duração.

Ricardo Alcântara
Escritor e publicitário

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