A história da música ‘Toque de Silêncio’.
Dando continuidade às histórias por trás das músicas, hoje vamos dividir com os leitores do FOCO NO ASSUNTO a história de uma das melodias mais bonitas e que nos remete ao silêncio, à dor e ao respeito: a história da música “Toque de Silêncio” ou “TAPS”. Tudo começou durante um verão abafado da Guerra Civil Americana, em 1862, no acampamento do General da União Daniel Butterfield, em Harrison’s Landing, Virgínia. Insatisfeito com o toque francês rígido e formal, o “Extinguish Lights”, que ordenava o fim do dia, o general, que tinha suas inclinações musicais, ansiava por algo mais solene e contemplativo para aquele momento de recolhimento.
Foi então que a melodia ganhou vida. Butterfield chamou seu corneteiro, o soldado Oliver Willcox Norton, e, assobiando uma versão modificada de toques já conhecidos, pediu que ele a transcrevesse para a corneta. A grande inovação foi a eliminação dos rufos de tambor, criando uma peça puramente melódica, suave e profundamente emotiva. Essa simplicidade, longe de passar despercebida, mostrou-se poderosa. O novo toque foi um sucesso imediato no acampamento e rapidamente se espalhou, sendo adotado por outros regimentos da União e, de forma notável, também pelos soldados Confederados, tornando-se um raro símbolo de beleza compartilhada em meio ao fratricídio.
Contudo, a jornada do “Taps” para se tornar o som solene que conhecemos hoje teve um capítulo crucial marcado pela dor e pela praticidade. Originalmente um toque de recolher, sua transição para cerimônias fúnebres nasceu de uma necessidade humana. A lenda, ainda que possivelmente apócrifa, ilustra bem esse momento: conta que, após uma batalha, ao encontrarem o corpo de um soldado inimigo e desejarem homenageá-lo sem delatar sua posição com uma salva de tiros, um oficial ordenou que se tocasse o “Taps”. Historicamente, o primeiro uso documentado em um funeral foi do Capitão John Tidball, que optou pela corneta para enterrar um camarada em silêncio e segurança.
O nome “Taps” carrega em si uma origem peculiar, ligada à vida cotidiana dos soldados. É derivado da palavra holandesa “taptoe”, que significava “fechar a torneira” dos barris de cerveja. Esse termo era usado para se referir ao toque que marcava o fim do dia e, portanto, o fim do tempo para beber. Com o uso, “taptoe” foi abreviado para “Taps”, batizando de forma definitiva a melodia que anunciava o descanso.
Entre as narrativas que envolvem a música, uma lenda em particular ecoa com forte apelo emocional, embora não tenha comprovação histórica. É a história do Capitão Robert Ellicombe, que, ao resgatar um soldado inimigo ferido, descobriu horrorizado que se tratava de seu próprio filho. Na versão, ele teria pedido para enterrá-lo com honras e, em vez da salva de tiros, um único corneteiro tocou uma melodia encontrada no bolso do jovem – a partitura do “Taps”. Apesar de ser um mito, sua popularidade reforça o profundo poder de luto e reverência que a música consegue transmitir.
Hoje, o “Toque de Silêncio” transcendeu seu propósito militar original para se tornar um símbolo universal. Com suas 24 notas padronizadas, é o som solene em funerais de veteranos, bombeiros e policiais, marca o fim do dia em quartéis e é peça central em cerimônias cívicas como o Dia do Memorial. Sua essência permanece a mesma: uma melodia nascida para trazer conforto no crepúsculo, elevada a um comovente símbolo de respeito, memória e paz eterna, lembrando-nos da humanidade que nos une, mesmo nas divisões mais profundas.
“A vida sem a música seria um erro.” (Friedrich Nietzsche)