Um advogado vítima da fraude conhecida como “golpe da falsa central de atendimento” deverá ser indenizado em R$ 10 mil pelo Banco do Brasil. A decisão é da 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e teve a relatoria do desembargador Paulo Airton Albuquerque Filho.
Conforme o processo, o advogado é cliente da instituição financeira desde 1997 e, em dezembro de 2021, procurou o banco para obter informações sobre as possibilidades de transferência de pontos de um programa de recompensa. Ele havia sido notificado por e-mail acerca da existência de saldo suficiente para efetuar trocas e, para que isso ocorresse, bastaria entrar em contato com a agência bancária por telefone.
O homem contou ter tentado ligar para a empresa mais de uma vez, mas não conseguiu efetuar o procedimento por uma inconsistência no sistema. Por isso, ele decidiu retornar a chamada em um outro momento. No entanto, naquele mesmo dia, recebeu uma ligação de um suposto gerente do banco em questão, que o orientou a ir em qualquer agência e inserir o cartão em um terminal de autoatendimento para concluir o processo de transferência de pontos. Isso deveria ser feito com urgência, pois os pontos estariam prestes a expirar.
Acreditando estar falando com um funcionário banco, já que habitualmente recebia ligações de gerentes, o cliente cumpriu com as recomendações. Quando chegou à agência mais próxima, recebeu uma nova ligação, cujo número constava como aquele já registrado em seu telefone para identificar a chamada da agência na qual mantinha conta.
O advogado inseriu o cartão na máquina de autoatendimento e fez a leitura biométrica, enquanto o suposto gerente pedia que aguardasse a conclusão do procedimento. Após alguns minutos, a ligação foi encerrada abruptamente e ele recebeu uma notificação do banco comunicando sobre a aprovação de um empréstimo no valor de R$ 74 mil. Logo depois, chegou uma nova mensagem informando sobre uma transferência bancária de quase R$ 30 mil e de uma outra transação referente ao pagamento de uma conta de energia no valor de R$ 33,4 mil.
O cliente entrou em contato com a instituição e efetuou o bloqueio da conta. Ele decidiu procurar a Justiça após a instituição financeira afirmar que não encontrou qualquer fragilidade nas transações contestadas e, por isso, indeferir o pedido para que fossem anuladas, dando início às cobranças das parcelas do empréstimo. No processo, pediu pelo fim das cobranças e uma indenização por danos morais.
Na contestação, o Banco do Brasil alegou ser parte ilegítima do processo, pois o caso se trataria de uma questão de segurança pública e a instituição não poderia arcar com as operações realizadas fora de sua esfera. Além disso, argumentou não ter responsabilidade sobre as situações envolvendo o programa de recompensa, já que este tem personalidade jurídica própria. Alegou que o contrato do empréstimo era lícito e válido, já que foi assinado eletronicamente por mobile e que o cliente utilizou o terminal de autoatendimento.
A instituição financeira também disse que os clientes são frequentemente cientificados sobre as precauções que devem tomar para proteger os dados, devendo, portanto, o advogado suportar o ônus do seu descuido. Sobre as ligações, declarou não ter qualquer tipo de envolvimento, já que nenhum dos números indicados se tratava de um telefonema advindo de uma das suas agências.
Em outubro de 2023, a 5ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza desconsiderou as alegações sobre ilegitimidade passiva, já que o banco havia permitido a realização das operações contestadas. Citando o Código de Defesa do Consumidor, o magistrado avaliou que o fornecedor dos serviços deve responder pelos danos causados independentemente de culpa, e condenou o Banco do Brasil a pagar R$ 10 mil como reparação por danos morais, bem como declarou inexistentes as dívidas contestadas pelo advogado. Ainda foi determinada a restituição de eventuais descontos realizados na conta do cliente em razão dessas operações.
O banco apresentou recurso de apelação no TJCE (nº 0234727-87.2022.8.06.0001), reforçando que as transações foram inegavelmente realizadas pelo próprio advogado, que facilitou as operações, não existindo falha na prestação do serviço. A instituição afirmou não ter capacidade para prevenir ações criminosas e disse que tenta instruir os clientes sobre como proceder em casos de supostos golpes.
No último dia 29 de maio, a 2ª Câmara de Direito Privado manteve a sentença de 1º Grau inalterada por avaliar que o risco da atividade exercida pelas instituições bancárias exige a adoção de medidas de segurança que vedem a utilização de seus sistemas para a prática de fraudes. “Na medida em que o autor foi vítima de golpe ocasionado pela fragilidade do sistema de segurança da instituição bancária, que sequer bloqueou as operações financeiras totalmente dissociadas do perfil do consumidor, procedendo, ao revés, com a cobrança dessas, reputo cabível a indenização por danos morais”, destacou o relator.
Na data, o colegiado, formado pelos desembargadores Carlos Alberto Mendes Forte, Paulo Airton Albuquerque Filho, Maria de Fatima de Melo Loureiro, Jane Ruth Maia de Queiroga e Everardo Lucena Segundo (Presidente), julgou outros 259 processos.