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O poder irradiador das compras públicas

Durante a fiscalização, o Poder Público pode monitorar o cumprimento das cláusulas sustentáveis, verificar condições de trabalho dos prestadores de serviço, acompanhar o consumo e descarte adequado

Foto: Freepik

Uma aquisição feita por um órgão público pode ajudar a melhorar o planeta?! Sim, e este é talvez um dos mais espetaculares desafios da atualidade: manter acesa a tocha da sustentabilidade! Em outras palavras: – Como utilizar os recursos da natureza, suprir as nossas necessidades e, ao mesmo tempo, proteger o meio ambiente, sem comprometer as gerações futuras?!

Envenenados pela cobiça, acorrentados por padrões comportamentais equivocados, estamos destruindo o ambiente em que vivemos, pondo em risco o futuro e salpicando de lama os valores mais sublimes do humanismo. No dia 9 de dezembro de 2025, durante a sétima sessão da Assembleia Ambiental das Nações Unidas, em Nairóbi, no Quênia, foi lançado o mais abrangente relatório científico sobre o meio ambiente: “Perspectiva Global sobre o Meio Ambiente, Sétima Edição: Um Futuro Escolhemos” (GEO-7).

O novo Panorama Ambiental Global (Global Environment Outlook) traz um alerta estarrecedor: a sobrevivência na Terra está ameaçada! Estima-se que entre 20% e 40% da área terrestre mundial esteja degradada, afetando mais de três bilhões de pessoas, enquanto um milhão das cerca de oito milhões de espécies estão ameaçadas de extinção. Se continuarmos com a insanidade nos níveis atuais, vamos perder, a cada ano, terras férteis e produtivas do tamanho da Colômbia ou da Etiópia. E mais: as mudanças climáticas podem reduzir a disponibilidade de alimentos por pessoa em 3,4% até 2050.

Nove milhões de mortes ocorrem anualmente em decorrência de alguma forma de poluição. O custo econômico dos danos à saúde causados apenas pela poluição do ar foi de cerca de US$ 8,1 trilhões em 2019 — ou cerca de 6,1% do PIB global. As emissões de gases de efeito estufa aumentaram 1,5% ao ano desde 1990, atingindo um novo pico em 2024 — elevando as temperaturas globais e intensificando os impactos climáticos. O custo dos eventos climáticos extremos atribuídos às mudanças na atmosfera nos últimos 20 anos é estimado em 143 bilhões de dólares por ano.

Os 8 bilhões de toneladas de resíduos plásticos que poluem o planeta continuarão a se acumular — elevando as perdas econômicas anuais relacionadas à saúde, hoje estimadas em 1,5 trilhão de dólares, decorrentes da exposição a substâncias químicas tóxicas presentes nos plásticos. A continuarmos seguindo o caminho atual, o estado do meio ambiente piorará drasticamente. Sem ação, o aumento da temperatura média global provavelmente excederá 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais no início da década de 2030, excederá 2,0 °C na década de 2040 e continuará subindo. Mirem a gravidade desse dado: se não estancarmos o modelo predatório atual, as mudanças climáticas reduzirão 4% do PIB global anual até 2050 e 20% até o final do século.

O mais importante: a alteração dessa paisagem está em nossas mãos. A partir do nosso lar, do nosso relacionamento com os demais seres vivos (animais, árvores, humanos, flores etecétera) podemos contribuir para a assepsia planetária. Se você é um profissional liberal e adota, em seu escritório, canetas recarregáveis, cartuchos remanufaturados e papel reciclado ou com certificado de extração sustentável da madeira, saiba que está contribuindo para alterar o cenário alarmante revelado linhas atrás.

Se você é um gestor público, o seu horizonte contributivo se agiganta. Por exemplo: uma Prefeitura, a partir das compras que realiza, pode modificar substancialmente a vida das pessoas, direcionando recursos para a promoção de mudanças positivas na sociedade. Ao adotar critérios de sustentabilidade nos processos licitatórios, os gestores municipais não apenas cumprem exigências legais, mas também promovem inovação, eficiência e responsabilidade socioambiental.

Uma Licitação é mais que um procedimento burocrático. É um poderoso instrumento de política pública. Ao planejar, o agente público tem a oportunidade de definir necessidades reais, evitar desperdícios e calcular o “Custo Total de Propriedade” (do inglês: Total Cost of Ownership – TCO). Aqui, ao invés de considerar apenas o menor preço inicial, calcula-se quanto aquele bem ou serviço custará ao longo de sua vida útil. Na execução de um procedimento licitatório, o agente de contratação pode incluir critérios técnicos e de pontuação que valorizem práticas sustentáveis (certificações ambientais, eficiência energética, origem dos materiais). Durante a fiscalização, o Poder Público pode monitorar o cumprimento das cláusulas sustentáveis, verificar condições de trabalho dos prestadores de serviço, acompanhar o consumo e descarte adequado.

Há, portanto, senhoras e senhores gestores, um potencial revolucionário ao vosso dispor. Nas obras e construções, a opção por materiais de construção com menor impacto ambiental, sistemas de captação de água da chuva, eficiência energética nas instalações. Na alimentação escolar, a preferência por produtos orgânicos, de agricultura familiar local, comércio justo, redução de embalagens descartáveis. Na política de transporte, veículos com menor emissão de poluentes, combustíveis renováveis, manutenção preventiva para maior eficiência. Em todos os equipamentos, a adoção do uso racional de água e energia. Longe de serem abstratos, esses benefícios são palpáveis e se traduzem em economia real, maior satisfação da população e reconhecimento externo.

Sejam, pois, jardineiros do bem comum, cuidando para que as próximas gerações colham os frutos de uma coragem que começou hoje, entre uma assinatura e outra. Ao fim, uma certeza silenciosa: em cada escolha feita com consciência, plantamos um amanhã um pouco mais justo e respirável. As gerações, presentes e futuras, agradecem!

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